24 de set. de 2014

A Mauro o que é de Mauro

Semanas atrás, Mauro Cezar Pereira, do canal ESPN, antes do jogo Vitória x Fluminense declarou: "O Vitória, em qualquer lugar, é um time que dá pra ganhar. Acho que é o pior time do campeonato". A partir daí, o que se viu foi uma enxurrada de críticas direcionadas ao jornalista pela torcida rubro-negra. Diante da reação, Mauro usou de ironia e citou a tabela do Brasileirão para justificar os seus comentário. Os torcedores do Leão não aceitaram bem as palavras de Mauro, mesmo que o fato de o Vitória ser, àquela altura, o lanterna da competição mostrasse que o jornalista não estava de todo errado. De modo geral, era só olhar para a tabela para ver que a frase era um simples retrato da realidade. E é aí que mora o perigo. Reproduzir "um simples retrato da realidade", em alguns casos, não é o suficiente, ou, pelo menos, não deveria ser. Não deveria ser suficiente para um jornalista do maior canal esportivo do mundo reproduzir o óbvio, falar o que pode ser visto com uma rápida olhada na tabela do Campeonato. Isso deveria ser o papel do leigo, não de um jornalista da ESPN.

Mauro não falou nada de errado, mas foi raso o suficiente para ignorar alguns detalhes. Ele ignorou, por exemplo, que durante quase todo o primeiro turno o Vitória não pôde jogar no Barradão, local onde costuma ganhar a maioria dos seus pontos e onde voltaria a jogar no segundo turno - o que é um detalhe que apontava que o rendimento do time tenderia a melhorar (o jogo contra o Flu, que motivou o comentário de Mauro, seria nesse mesmo Barradão, onde o time havia vencido o Internacional, um time que se encontrava na parte alta da tabela).

Mauro, também, ignorou que muitos dos principais jogadores do clube não jogaram a maior parte do primeiro turno. Juan e, principalmente, Escudero foram as faltas mais sentidas, no meio de muitas outras, e tinham voltas previstas para atuarem na metade final do Brasileirão. Mais um indício de que o time tinha potencial para uma reação. Muitas outras peças foram contratadas ao longo da competição e estavam começando a entrar em forma com chances de aumentar em muito o nível técnico do time. Eu citaria Gatito Fernandez e Richarlyson como os principais.

O que falar do fato de Mauro não levar em consideração a volta de Ney Franco? O técnico já tinha dado provas, no próprio Vitória, de que tinha mais capacidade que seu antecessor, Jorginho.

Foi um erro, também, não levar em conta o bolo que está o Z4 esse ano. Nenhum dos times ameaçados podem ser considerados "galinhas mortas", como foram os lanternas em anos anteriores.

Indícios não faltavam de que o jogo do Vitória contra o tricolor carioca (que por méritos estritamente futebolísticos deveria estar na serie B), no Barradão, não deveria ser encarado  como um jogo fácil para o Fluminense. Eu poderia ficar aqui elencando várias outras informações que permitissem uma análise mais segura do que a simples olhada na tabela. De um jornalista competente, se espera que esse tipo de informação ajude na formatação de suas opiniões e comentários. E falo isso não só a respeito do Vitória, logicamente, mas de todos os 20 times do Campeonato. Caso contrário, quem está sendo pago, e muito bem, para ir além do óbvio, estará simplesmente falando o que qualquer leigo pode inferir com uma simples e rápida consulta à tabela da Competição. O que não chega a ser errado, mas é pouco, muito pouco.

Então, acho que devemos dar a Mauro o que é de Mauro: o direito de ser um jornalista medíocre, assim como tantos outros, que, mesmo sendo muito bem pagos para trabalharem em canais nacionais, só são capazes de se manter minimamente bem informados sobre os times do Rio e de São Paulo (e um pouquinho, a contragosto, dos clubes gaúchos e mineiros).

P.S.: Eu queria ter escrito esse texto assim que vi a declaração de Mauro, mas como não trabalho escrevendo e opinando sobre futebol, acabei só conseguindo escrever agora. O Vitória, hoje, não é mais o lanterna da competição, mas pode voltar a ser. O futebol é muito dinâmico, e esse ano, em especial, a disputa na parte de baixo da tabela está incrivelmente equilibrada. Porém, mesmo que isso aconteça e o clube seja rebaixado, nada vai mudar a realidade: os torcedores esperam, ou deveriam esperar, das pessoas da mídia mais do que o óbvio.

7 de jul. de 2014

Eu e a Copa

Lembro tão bem de quando eu tinha dez anos de idade. Foi nessa época que eu ouvir falar pela primeira vez sobre alguns países. Tive contato com as bandeiras, localizações geográfica e dados culturais de nações como Camarões, Costa Rica e Emirados Árabes Unidos, por exemplo. Desde então, meu interesse por esse tipo de conhecimento só fez crescer e me acompanha até hoje (não por acaso me tornei geógrafo, não por acaso meu programa televisivo favorito é o Não Conta Lá em Casa).

Isso tudo aconteceu por causa de uma competição esportiva. Completei minha primeira década de vida em 1990, ano em que foi realizada, na Itália, a décima quarta edição da Copa do Mundo, e os países citados no parágrafo anterior estavam lá. Foi a primeira vez em que eu acompanhei de fato a competição, lembro-me de cada detalhe. E lembro, ainda mais perfeitamente, que, desde aquele tempo, eu entendi que uma Copa vai muito além das coisas que acontecem dentro das quatro linhas. E olhe que dentro dos gramados coisas extraordinárias acontecem, de quatro e quatro anos, quando os maiores atletas do mundo se reúnem pra a competição mais importante de suas vidas. Tenho certeza que jamais me esquecerei dos feitos de Totò Schillaci, Walter Zenga e Roger Milla, em 90.

É durante a Copa que a imprensa mais produz matérias a respeito de outros países. É certo que foi durante alguma das participações da Croácia em Copas, que muitos conheceram as belezas daquele país e souberam que ele, tempos atrás, era parte integrante da Iugoslávia. Em 2010, aposto que muitos ficaram sabendo o quanto a Coreia do Norte é uma nação altamente fechada para o mundo exterior. Esse ano, deve ter sido grande o número de pessoas que descobriu que o persa é a língua oficial do Irã, tão grande quanto o número dos que tiveram contato pela primeira vez com o “pura vida” da Costa Rica.

Mesmo em tempos em que a globalização é palavra da moda, é difícil imaginar outros eventos que sejam capazes de provocar tamanha interação entre povos (e uma interação tão positiva, diga-se de passagem). A maioria da nações ainda vive de forma muito isolada entre si. E a Copa ajuda a promover a integração de forma bastante eficiente e positiva. Quantas pessoas foram pela primeira vez ao continente africano na Copa da África do Sul? Em que outra oportunidade um soteropolitano poderia ver a alegre interação entre bósnios e iranianos? Provavelmente, só os Jogos Olímpicos conseguem feito parecido.

Se fora de campo a Copa é fantástica, para os apaixonados por futebol, como eu, dentro de campo, também, é maravilhoso acompanhar uma competição em que praticamente 100% dos jogos são jogos históricos, e isso não é simplesmente modo de falar. Com o passar do tempo, cada um dos jogos assume papel histórico para as gerações de atletas e torcedores de cada um dos países que tem a sorte e a competência de participar da festa. Sejam vitória, empates ou derrotas, cada confronto ajuda a contar parte significativa da história do futebol. Ter a oportunidade de ver os maiores craques juntos fazendo todo o sacrifício pelos seus países é sempre um momento mágico.

Fato é que, desde criança, eu adoro Copa do Mundo e falar isso para as pessoas nunca me gerou nenhum tipo de problema ou desconforto. Até o dia em que passamos a acompanhar a Copa ser organizada em nosso próprio país. Ai a coisa mudou. Nos últimos meses se tornou normal que algumas pessoas tentassem constranger aqueles que demonstrassem entusiasmo com a realização do mundial. O auge desse movimento foi o tal do #nãovaitercopa. Eu, particularmente, tive trabalho para convencer alguns conhecidos de que era, sim, possível separar a maravilha que é receber uma Copa dos abusos e erros de governos e dirigentes.

No final das contas, fiquei feliz ao ver a maior parte do país entrar no clima, mesmo que com certo atraso. Fiquei feliz ao perceber que muita gente passou a entender que o fato de acompanhar e apoiar esse evento esportivo, não os torna um apoiador ou cúmplice de dirigentes corruptos. Eu entenderia perfeitamente se a maioria dos brasileiros fosse contra a realização do evento, quando da candidatura do Brasil a país sede, embora eu definitivamente fosse a favor desde o início, essa é a beleza da democracia. Mas tentar avacalhar o evento depois de confirmado, seria uma atitude altamente calhorda, egoísta e prepotente. Sorte nossa que o #nãovaitercopa acabou virando apenas uma piada de brasileiro.

Poderia listar aqui acontecimentos mágicos que essa Copa já produziu, mesmo antes de chegar às semifinais, mas sei que é desnecessário. Tenho certeza que qualquer pessoa como mínimo de sensibilidade já se emocionou com algum momento produzido por jogadores e torcedores desde que a copa começou no início do mês passado.

Pois é, muito cedo eu percebi que o mundial de futebol é um dos momentos em que a humanidade consegue mostrar o seu lado mais positivo. Desde aquele, hoje distante, ano de 1990 eu sonhava em ver uma Copa do Mundo de perto, mas as circunstâncias de minha vida fizeram com que o primeiro Mundial que eu pudesse vivenciar in loco acontecesse justamente em meu país, em minha cidade, em minha casa. No final fico satisfeito de pensar que em nenhum momento eu deixei as coisas ficarem confusas em minha cabeça e aproveitei cada instante desse evento sensacional. Rússia, em 2018, tô ai!!!

11 de mar. de 2014

A promiscuidade da imprensa baiana II

Ano passado escrevi um texto em que expus uma situação que deixava claro o nível de promiscuidade da imprensa baiana. Aqui o Link. Naquela ocasião, o que mais me chamou a atenção foi a resposta que obtive do “jornalista” envolvido na história. Após ler meu texto, ele se mostrou absolutamente surpreso com o fato de eu o acusar de antiético. Para ele, aquela situação era totalmente “normal”.  Ele acredita que o fato de ser corriqueira a promiscuidade da ação jornalística na imprensa esportiva baiana é suficiente para que ele fosse absolvido. Mas se algo está impregnado em determinado grupo social isso não o torna automaticamente moral. Se, por exemplo, em determinado grupo for habitual que seus membros roubem uns aos outros, isso não torna o roubo algo correto.

Pois bem, hoje me vi diante de mais uma situação parecida. Essa semana o Bahia divulgou um lista em que detalhava valores gastos com pessoas de fora do clube. Dentre eles surgiu um gasto de aproximadamente R$ 45.000,00 identificados pelo nome do “jornalista” Jailson Baraúna. Como, a principio, a lista não descreve a que se referem exatamente esses gastos, não há que se condenar os envolvidos sem que antes eles tenham direito de justificar o recebimento desses valores.

Dessa forma, hoje li a tentativa de justificativa do Baraúna. Ela alega que os valores são referentes ao pagamento de espaços publicitários utilizados pelo clube no seu programa de rádio. Assim, ele acredita estar totalmente amparado. Ele não parece não conseguir enxergar nenhum conflito ético. Mas eu não consigo imaginar como é possível manter a credibilidade, a busca da imparcialidade e o distanciamento, tão necessários ao bom exercício jornalístico, se o profissional de imprensa recebe diretamente pagamento de quem é objeto do seu trabalho. Com que autonomia um jornalista pode trabalhar, se parte de seus rendimentos é pago por um clube de futebol que é o ponto focal de seu trabalho? Com que distanciamento será possível fazer críticas a esse clube, sabendo que mensalmente irá receber valores desse mesmo clube? É estranho, também, que esse valor seja descrito nas planilhas nominalmente ao Baraúna. Não faria mais sentido se esse valor estivesse simplesmente associado nas planilhas do clube à gasto com publicidade?

Nesse caso, a coisa é ainda mais bizarra, pois como é praxe nos programas esportivos de rádios baianas, o espaço publicitário é pago diretamente à equipe esportiva. Ou seja, nesse caso, ele não é um funcionário que recebe um salário de um veiculo que por sua vez recebe os valores de publicidade. No caso em questão, os jornalistas são “donos” do espaço de publicitário por isso recebem diretamente esses valores.

Assim, mais uma vez fico triste em ver o nível rasteiro em que se encontra nossa imprensa. Esse “jornalista” acha que por ser comum, esse procedimento é correto. E eu não tenho medo algum em afirmar: isso não é correto. Isso é extremamente errado, do ponto de vista da ética, sobretudo da ética jornalística, que deve ser regida pelo principio básico da credibilidade, que deve ser assegurada pela autonomia. 

O mais triste é perceber, mais uma vez, que esse não é um fato isolado. E isso faz com que parte da imprensa seja incapaz de simplesmente entender o buraco em que estão metidos e os poucos que conseguem perceber essa dimensão não tem coragem ou interesse em expor a situação. E tenho certeza que logo aparecerão outros envolvidos nessa lista do Bahia dando desculpas parecidas, como se fosse possível manter a independência recebendo passagens, hospedagens, alimentação, verba publicitária...Triste Bahia.

Atualização: Ao contrário do que disse Baraúna, segundo lista que circula em outros blogs, o valor referente a esse jornalista inclui o pagamento de 73 passagens aéreas, que totalizam quase  R$ 40.000,00.